“Dosis sola facit venenum.” Paracelsus, 1538
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quarta-feira, 15 de junho de 2011

E. coli e outras bactérias causadoras de intoxicações alimentares

O elevado número de notícias difundidas pela comunicação social portuguesa sobre a contaminação de alimentos pela bactéria Escherichia coli (adiante designada abreviadamente por E.coli) ocorrida na Alemanha deixou muita gente alarmada. Os jornalistas (salvo raras excepções) ávidos de notícias sensacionalistas, neste como em muitos outros casos, propagam informações umas vezes exageradas outras parcial ou totalmente incorrectas, provenientes de fontes duvidosas, amiúde citando alegados “especialistas” que pouco ou nada percebem do assunto em causa. Este tipo de atitude recolhe habitualmente a conivência das autoridades (tanto nacionais como internacionais) e aproveita-se da iliteracia científica da generalidade da população e da tendência que todos temos para, em situações de possível risco, inibirmos o espírito crítico e agirmos precipitadamente, que é precisamente o que pretendem os interesses económicos e/ou políticos que sustentam a confusão/desinformação.

Neste caso concreto da contaminação de alimentos pela bactéria E.coli, a comunicação social exagerou porque tentou (uma vez mais) transformar em algo de verdadeiramente excepcional um surto idêntico a outros. A título de exemplo, na União Europeia, em 2006 foram comunicados oficialmente 5 710 surtos de contaminação alimentar por E.coli, que envolveram 53 568 pessoas, mais de meia centena das quais viria a falecer. Em 2008 um surto da dita bactéria encontrada em carne picada provocou intoxicações alimentares a 3 159 cidadãos europeus. Em Portugal (apesar de não haver dados exactos) e nos países do Sul da Europa estes surtos parecem ser pouco frequentes e afectarem um pequeno número de pessoas, mas nos países mais ao Norte, devido ao facto do processamento, empacotamento e distribuição de alimentos se realizar em grande escala, qualquer contaminação acaba por afectar grandes quantidades de alimentos, distribuídos por supermercados, escolas, restaurantes, etc., intoxicando assim um grande número de pessoas. Por exemplo, nos Estados Unidos, os CDC (Centers for Disease Control and Prevention), organismos com funções idênticas à nossa Direcção-Geral de Saúde, estimam que, só pela E.coli, sejam contaminados anualmente cerca de 25 mil norte-americanos, dos quais 0,4% (uma centena) acabam por falecer. Nos países asiáticos e africanos, onde os cuidados de higiene (sobretudo da população mais pobre) são menores estima-se um número muito mais elevado de contaminados e devido aos fracos cuidados médicos suspeita-se de um elevado número de vítimas mortais.

As autoridades alemãs também não agiram da forma mais correcta pois em vez de explicarem à população o que se deve fazer para reduzir a probabilidade de uma intoxicação alimentar por bactérias, optaram por aconselhar a não ingestão de determinados alimentos (primeiro pepinos, depois alfaces e tomates, mais tarde rebentos de vegetais) sem terem a mínima ideia de qual ou quais destes alimentos estavam na origem da contaminação, sendo que, qualquer um deles (e muitos outros) poderia ter causado o surto.

Depois desta longa introdução em jeito de comentário, passemos então a tentar esclarecer o que se pode fazer para reduzir a probabilidade de sermos vítimas de uma intoxicação alimentar, por bactérias.

Em termos de preocupação com a segurança dos alimentos, a contaminação bacteriana, problema que afecta a água (de alguns poços, ribeiros e lagoas), a carne, o peixe, os lacticínios, os ovos, os frutos, os vegetais e outros alimentos que se comem crus (como nalgumas culturas (o marisco ou os rebentos de leguminosas) é a ameaça que eclipsa todas as outras. São três as bactérias responsáveis pela maioria das gastroenterites (vulgo intoxicações alimentares) bacterianas:

E. coli. – A bactéria vive nos intestinos de inúmeros animais de sangue quente, incluindo o Homem. As principais causas de contaminação dos alimentos por esta bactéria são: manusear alimentos depois de ter ido à casa de banho e não ter lavado convenientemente as mãos com água corrente e sabão (gel ou detergente); comer carne (ou peixe) crua cuja manipulação foi incorrecta tendo o conteúdo dos intestinos do animal entrado em contacto com a carne; não lavar devidamente os vegetais (ou os frutos que podem ter sido colhidos do chão) antes de os cortar para a salada (ou descascar e comer), podendo estes ter estado em contacto directo com o estrume que aduba os campos ou em contacto com caixotes contaminados usados no transporte dos alimentos. A intoxicação por E. coli é a causa mais comum de insuficiência renal súbita nas crianças e em caso de grande contaminação pode mesmo causar lesões renais em adultos. Anualmente milhões de quilos de alimentos (principalmente carne de aves, picada) são recolhidos pelas autoridades sanitárias europeias, devido à contaminação por E. coli. Os danos causados ao organismo humano devem-se a uma toxina chamada shiga, frequentemente encontrada em alguns subtipos da bactéria.

Salmonella - Esta bactéria é encontrada principalmente nos ovos (mas também na carne, no peixe e nos mariscos). Pode disseminar-se para outros alimentos, sobretudo lacticínios e frutas que contactem (por exemplo, aquando do transporte) com carne ou ovos contaminados. Um estudo publicado em 2001, no The New England Journal of Medicine, revelou até que ponto a prevalência desta bactéria é alarmante: em Inglaterra foram analisadas 200 amostras de carne picada de frango, vaca, peru e porco, 40 dessas amostras continham Salmonella.

Campylobacter - Geralmente chega ao nosso organismo através da ingestão de carne de aves. Esta bactéria é a causa mais comum de gastroenterite bacteriana nos países desenvolvidos, tendo em 2008 sido notificados quase 200 mil casos na União Europeia e quase dois milhões e meio nos Estados Unidos.

Várias outras bactérias podem provocar intoxicações alimentares mas, no seu conjunto, representam apenas uma em cada mil intoxicações.

Os principais sintomas das intoxicações alimentares são: dores abdominais, febre, vómitos, manchas na pele, diarreia e sensação de cansaço.

O que devemos fazer para evitar as contaminações?

Em primeiro lugar, como já referi acima, é imprescindível que se lavem bem as mãos (com água corrente e sabão) sempre que vamos à casa de banho. Igualmente essencial é nunca beber água que não tenhamos a certeza que é potável. É também importante lavarmos frequentemente as mãos ao longo do dia, principalmente antes e durante a preparação dos alimentos (a cada alimento diferente, a manipular, devemos lavar bem as mãos (com sabão se o alimento for gorduroso)). Não devemos limpar as mãos a um pano ou toalha se as não tivermos acabado de lavar, pois as bactérias aí depositadas encontram um bom meio para se multiplicarem.

Especificamente no que diz directamente respeito aos alimentos, devemos: Evitar adquirir carne (principalmente de aves) previamente picada, a maioria dos talhos e supermercados picam (a nosso pedido) a carne na hora; Cozinhar bem o peixe e a superfície exterior da carne que já esteve duas (ou mais) horas exposta à temperatura ambiente (principalmente no Verão); Lavar bem, com água corrente, os alimentos que comemos crus (mesmo os frutos que descascamos) e todos os que caírem ao chão durante a manipulação certificando-se que toda a sua superfície é esfregada com a mão (não é preciso força para remover as bactérias que, sendo microorganismos, são facilmente destruídos pelo atrito da mão com o alimento e arrastados (tal como as suas toxinas) pela água); Retirar sempre os intestinos do peixe (e da carne, se for o caso), e lavá-lo em água corrente antes de o cozinhar; Ter em conta que as superfícies onde colocamos os alimentos sujos também precisam de ser lavadas antes de colocarmos sobre elas alimentos limpos (o mesmo se aplica aos utensílios de cozinha).

As sobras dos alimentos devem ser guardadas o mais rapidamente possível no frigorífico ou no congelador (conforme os casos). Devemos manter o frigorífico a temperatura inferior a 5 ˚C e o congelador a temperatura igual ou inferior a -18 ˚C. Convém dividir os alimentos em pequenas porções para arrefecerem mais rapidamente. Tenhamos em atenção que o frio não destrói as bactérias apenas as impede de se reproduzirem. As bactérias morrem se forem expostas a temperaturas superiores a 70 ˚C ou a radiação ultravioleta (ou mais energética).

Referências: Harvard Medical School; Merck Sharp & Dohme; Centers for Disease Control and Prevention.